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"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quarta-feira, setembro 20, 2017

Nacionalismo fora de lugar põe fogo na Catalunha


clóvis rossi .

Clóvis Rossi 
Folha de S. Paulo

Um espírito semelhante ao de Donald Trump acabou por incendiar a Catalunha, uma das regiões do mundo que menos tem a ver com o presidente americano.
Explico: pôr a Catalunha primeiro –como reza o mantra de Trump– levou o governo local a convocar um plebiscito para decidir se a população quer ou não a independência. Será no próximo dia 1º.

O plebiscito é ilegal, decidiu, como era inevitável, o Tribunal Constitucional. Seria eventualmente legal se pudessem votar todos os espanhóis, não apenas os catalães. Faz sentido: todos os espanhóis têm óbvio interesse em manter a Catalunha na Espanha ou jogá-la para fora. Logo, todos deveriam votar.

O governo central, armado com a decisão do Tribunal Constitucional, desfechou nesta quarta-feira (20) uma ofensiva contra os organizadores da votação. Foram presos 12 altos funcionários do governo da Catalunha, pela sua vinculação com os preparativos para o plebiscito.


Entre os presos, aparece Josep María Jové, secretário-geral de Economia da Generalitat (o governo local), ainda por cima o braço direito de Oriol Junqueras, vice-presidente regional e a principal figura do movimento independentista.

Consequência inevitável: mobilização dos partidários da independência em defesa dos atacados na operação, que foi levada a cabo pela "Guardia Civil", o que traz sempre recordações da ditadura franquista (1939/1975), que de fato sufocou o catalanismo.

Agora, no entanto, a Catalunha goza de ampla autonomia, o catalão pode (e é) falado livremente, ensinado nas escolas, há jornais no idioma, e a região goza mais que as demais comunidades autônomas do progresso econômico. Tanto é assim que, se a renda média da Espanha é 100, a da Catalunha é 119,7 (dados de 2013, últimos para os quais a comparação é possível).

Não procede, além disso, a frase mais usada pelos independentistas ("a Espanha nos rouba"). Se fosse assim, a Catalunha, com 16% da população, não teria 18% da economia espanhola –sua região mais rica, aliás.

Discutir se a independência tem uma justificativa histórica é entrar em território minado, tantas são as controvérsias a respeito. De qualquer forma, o catalanismo é um estado de espírito com forte implantação: mais ou menos metade da população de 7,5 milhões apoia a independência.

A pesquisa mais recente, feita em julho e encomendada pelo próprio governo regional que convocou o plebiscito, mostrou 41% a favor da independência e 49% contra.

Josep Lago/AFP
Manifestante e soldado da Guarda Civil em frente de prédio do governo regional da Catalunha
Manifestante e soldado da Guarda Civil em frente de prédio do governo regional da Catalunha
Em votação igualmente ilegal, em 2014, compareceram apenas 2,2 milhões de eleitores de um total potencial de 5,4 milhões.

No dia 10, "El País" publicou pesquisa em que 56% disseram considerar o plebiscito ilegal (entre os jovens de 18 a 34 anos, a porcentagem subia a 63%).
A pesquisa mostrava que 56% defendiam buscar uma saída negociada para a crise entre o governo central e o da Catalunha. Seria de fato o ideal, mas o incêndio desatado nesta quarta-feira criou tal instabilidade que dá razão à opinião do escritor Valentì Puig em texto para "El País".

"A gravidade extrema dos fatos protagonizados pelo secessionismo –quer dizer, pela Generalitat– é de uma magnitude tão catastrófica que quase impede pensar no que pode ser o dia seguinte. A autodestruição institucional, a incerteza jurídica, o temor imediato à instabilidade, a perda de coesão social e o desacato que enfrenta a Catalunha com o Estado [central] terão consequências não apenas políticas, mas que afetarão toda a cidadania", afirmou Puig.

Uma crise besta, mais uma a pôr na conta do nacionalismo. 

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Benê Lima